sábado, 14 de abril de 2012

Um pé em Espanha e outro em Portugal “La Ruta de los Túneles”


Junto à fronteira espanhola, uma velha linha de comboio jaz no fundo dos vales do Rio Águeda, esquecida e desgastada pela passagem do tempo, liga Barca d’Alva à pequena aldeia espanhola Fregeneda. Este pequeno troço de 17 km, faz parte da Linha Internacional de Pocinho a La Fuente de San Esteban; é uma via-férrea em bitola ibérica que liga o término da Linha do Douro, no nordeste de Portugal, à rede ferroviária Espanhola. Até ao encerramento deste troço, em 1985, existiam regularmente comboios de mercadorias e de passageiros entre Porto e Salamanca.
Os trabalhos de construção deste troço foram iniciados em 1882 e concluída em 1887. O troço entre Barca d’Alva e La Fregeneda, constituindo uma formidável obra de engenharia, foi dos mais difíceis construção sendo uma autêntica via alpina com curvas de raio mínimo de 300 m e rampas de 21%, tendo em apenas 17 km de linha-férrea 13 pontes metálicas e 20 túneis, é um dos percursos mais emblemáticos desta região e apetecível quer por Portuguese quer por Espanhóis.
Esta nossa expedição começou às 8:30 da manhã na estação de Fregeneda e logo após 100m entramos no túnel n.º1, avistava-se um pequena luz ao fundo do túnel e andamos, andamos, tornamos a andar, olhamos para trás e a luz da entrada ainda era maior do que a luz da saída (sinal que ainda não tínhamos percorrido metade do túnel), continuamos a andar e a tropeçar em alguns morcegos (morcego-de-ferradura-grande e morcego-de-ferradura-pequeno), até que ao final de 1,5 Km dentro do túnel vimos a luz do dia.
Mal saídos do túnel n.º1 os rastos de raposa, gineta e fuinha, sucedem-se mais ou menos constantes ao longo de todo o percurso. Tendo sempre como companhia a paisagem de vales cobertos de zimbro e azinheiras, com esporádicas fragas de granito.

À saída do túnel n.º2, 8 grifos sobrevoavam sobre nós em círculos de forma despreocupada como é típico destes necrófagos, mais ao longe por de trás de um cabeço, surge um Falcão-peregrino, que depois de nos sentir desapareceu na imensidão do vale, mais à frente uns metros, eis que surgem os primeiros Melro-azul! Atraídos por um cantar melódico, foi possível observar uma toutinegra-de-bigodes.

O túnel n.º3, embora mais curto que o primeiro, a sua curvatura, permite ter condições de luminosidade e climatéricas (mais estáveis), mais propícias para os morcegos, visto que aqui se encontra um número muito significativo (na ordem das várias centenas ou mesmo um par de milhares) de morcegos constituída maioritariamente por Myotis grandes, mais esparsas podem ser observadas pequenas agrupações de morcego-de-ferradura-grande ou indivíduos isolados de morcego-de-ferradura-pequeno.

Presença constante nos tuneis é a andorinha-das-rochas, que à entrada e saída de cada túnel faz os seus ninhos! A segurança dos túneis é também aproveitada por outras aves, nas pequenas escarpas à saída e entrada dos mesmos, a presença de dejetos indicia o local de dormitório de algumas perdizes.
À saída do túnel 4, no chão encontramos um andorinha-das-rochas, talvez debilitada pela azáfama da construção do ninho ou alimentação das suas crias. Este túnel é seguido imediatamente por um viaduto (n.º3) do qual conseguimos observar um ninho de grifo com uma cria (pelo menos) e a sua progenitora.

Mal tínhamos saído do túnel n.º5, surgem unas sombras no ar, 4 abutre-do-egipto fizeram-nos permanecer com os binóculos dos olhos durante alguns minutos, este abutre (o mais pequeno da nossa fauna) é umas das aves migradoras mais precoces dando-lhe mesmo o nome popular de “criado do cuco”.
Embora tivéssemos ido com a preceptiva de observar algumas espécies de répteis, as nossas observações restringiram-se á lagartixa-do-mato, lagartixa-ibérica e um par de exemplares de cobras-de-ferradura, que aproveitam o calor da primavera estrincando-se sobre o metal dos carris.

Já junto ao Túnel n.º15, numa fugaz aparição, eis que surge a rainha dos céus, uma Águia-real!
As pontes/viadutos que existem neste troço, além de serem mais complicados de atravessar do que os tuneis (principalmente para quem tem vertigens!!!!) não apresentam uma diversidade tão elevada quanto as pontes, mas são importantes locais de marcação delimites de território de alguns pequenos carnívoros, nomeadamente a presença de latrinas de gineta.


Uma pequena paragem para disfrutar da paisagem do rio Águeda e para saborear um delicioso fruto silvestre, figos-da-india, estes frutos são uma combinação de sabor e textura entre a pêra, o melão a melancia com uma pitada de toque tropical, mas com uns pequenos e danados espinhos! Atualmente estes frutos em muitos locais caiem de maduro sem ninguém os aproveitar a não ser os mamíferos e aves da região.

Já na parte final do percurso e junto ao Rio Douro foi possível ainda observar uma garça-real e um par de milhafres-pretos. Após 10 horas de caminha e 17 Km de paços irregulares (provocado pela travessas da linha férrea e o cascalho) as forças foram restabelecidas numa esplanada em Barca D’Alva na companhia de um par de cervejas!
No entanto, o estado de abandono e degradação de ambas a estações e da própria linha deixa um pouco de angústia, pois poderia ser recuperada e aproveitada para turismo… Sem dúvida que o sucesso era garantido.


Um percurso fantástico, de rara beleza paisagístico e arquitetónico. Um percurso de desafio às fobias a quem tiver medo do escuro, de morcegos ou de alturas, mas que no fim vai chegar e dizer que não custou nada e que valeu a pena.
Uma experiência a repetir…
Post escrito pelos aventureiros, João Gaiola e Paulo Barros

2 comentários:

Dylan disse...

Excelente trabalho! É de facto uma pena ver que, do lado português, estas linhas do caminho de ferro não têm qualquer aproveitamento turístico.

Luís Braz disse...

Bom registo! Mete mesmo dó ver uma linha férrea tão bela nesse estado....

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